5ª Aparição - Setembro 1917

Ao aproximar-se a hora, lá fui, com a Jacinta e o Francisco, entre numerosas pessoas que a custo nos deixavam andar. As estradas estavam apinhadas de gente. Todos nos queriam ver e falar. Ali não havia respeito hu­mano. Numerosas pessoas, e até senhoras e cavalheiros, conse­guindo romper por entre a multidão que à nossa volta se apinha­va, vinham prostrar-se, de joelhos, diante de nós, pedindo que apresentássemos a Nossa Senhora as suas necessidades. Ou­tros, não conseguindo chegar junto de nós, chamavam de longe:

- Pelo amor de Deus! peçam a Nossa Senhora que me cure meu filho, que é aleijadinho! Outro:
- Que me cure o meu, que é cego! Outro:
- O meu, que é surdo!
- Que me traga meu marido...
- ... meu filho, que anda na guerra!
- Que me converta um pecador!
- Que me dê saúde, que estou tuberculoso!Etc., etc.

Ali apareciam todas (as) misérias da pobre humanidade. E alguns gritavam até do cimo das árvores e paredes, para onde subiam, com o fim de nos ver passar. Dizendo a uns que sim, dando a mão a outros para os ajudar a levantar do pó da terra, lá fomos andando, graças a alguns cavalheiros que nos iam abrindo passagem por entre a multidão.

Quando agora leio, no Novo Testamento, essas cenas tão encantadoras da passagem de Nosso Senhor pela Palestina, re­cordo estas que, tão criança ainda, Nosso Senhor me fez presen­ciar, nesses pobres caminhos e estradas de Aljustrel a Fátima e à Cova de Iria, e dou graças a Deus, oferecendo-Lhe a fé do nosso bom Povo português. E penso: se esta gente se abate assim dian­te de três pobres crianças, só porque a elas é concebida misericor­diosamente a graça de falar com (a) Mãe de Deus, que não fariam, se vissem diante de si o próprio Jesus Cristo?

Bem; mas isto não era nada chamado para aqui. Foi mais uma distracção da pena que me escapou para onde eu não que­ria. Paciência! Mais uma coisa inútil; não na tiro, para não inutili­zar o caderno.

Chegámos, por fim, à Cova de Iria, junto da carrasqueira e começamos a rezar o terço com o povo. Pouco depois, vimos o reflexo da luz e a seguir Nossa Senhora sobre a azinheira.
- Continuem a rezar o terço, para alcançarem o fim da guer­ra. Em Outubro virá também Nosso Senhor, Nossa Senhora das Dores e do Carmo, S. José com o Menino Jesus para abençoarem o Mundo. Deus está contente com os vossos sacrifícios, mas não quer que durmais com a corda; trazei-a só durante o dia.
- Têm-me pedido para Lhe pedir muitas coisas: a cura de alguns doentes, dum surdo-mudo.
- Sim, alguns curarei; outros não. Em Outubro farei o mila­gre, para que todos acreditem. E começando a elevar-se, desa­pareceu como de costume.

In, Memórias da Irmã Lúcia